sexta-feira, dezembro 03, 2010

Júlia Lemmertz diz: "todo mundo é um pouco Amélia de 'Araguaia'"


Em 'Araguaia', Júlia Lemmertz vive a solitária Amélia. Foto: Pedro Paulo Figueiredo/Carta Z Notícias/TV Press Júlia Lemmertz faz par romântico com Lima Duarte em 'Araguaia'
Analisar as características da solitária Amélia é uma tarefa claramente prazerosa para Júlia Lemmertz. A pacata atriz gaúcha deixa de lado a costumeira voz baixa e a postura impecável ao traçar o perfil psicológico de sua personagem em Araguaia, novela das seis da Globo. A problemática da infeliz dona de casa, no entanto, não é o único motivo para a empolgação de Júlia. De volta às novelas após quase três anos, ela comemora o retorno em uma produção que, para ela, os atrativos vão muito além de seu papel. "Penso no personagem, obviamente, mas também penso muito no todo: na novela, nos outros personagens, atores, quem escreve, e o que pode ser da trama. É um pouco como no cinema, não adianta ter um papel maravilhoso em um filme ruim", comparou a atriz, que integra a trama a convite do diretor Marcos Schechtman, a quem considera "um irmão" e com quem trabalha junto desde Amazônia, exibida pela extinta Manchete em 1991.
Na trama assinada por Walther Negrão, Amélia é uma ex-modelo de origem humilde que mantém um casamento por interesse com o rico criador de gado Max, personagem de Lima Duarte. Com ele, tem dois filhos: o arquiteto Fred, de Raphael Vianna, e a veterinária Manuela, de Milena Toscano. Vivendo uma relação conturbada com o marido, ela começa a se envolver com o ex-genro Vitor, interpretado por Thiago Fragoso. "Eles se agarram como uma tábua de salvação um para o outro. A Amélia é uma personagem contraditória, perdida na vida. Mas todo mundo é um pouco assim", analisou.
Em Araguaia, o grande dilema de sua personagem é manter um casamento por interesse com um homem 30 anos mais velho, ao mesmo tempo em que se envolve com o ex-genro, 20 anos mais novo. Que tal fazer par romântico com gerações tão distintas?
Acho muito rico. A Amélia é uma personagem cheia de dilemas e vazios. Uma mulher boa, mas que se deu bem na vida após um casamento arranjado. Os dilemas amorosos dela são um exercício interessante porque o Lima, por exemplo, é um ator muito exigente, então você tem de ficar atenta o tempo todo. Ele valoriza o trabalho dele e, por consequência, o de quem está junto. Já o Thiago é um jovem ator maduro, com quem converso muito para tentar construir uma relação real. O melhor é que Araguaia é um novelão dos bons, com histórias de amores impossíveis e desencontros. Estou gostando.
Você esperava alguma polêmica em função desses relacionamentos?
Quanto a público, não. Tem tantas coisas mais loucas. A história da Estela, por exemplo. Acho que isso não existe mais hoje em dia. Você vê tanto homem mais velho casando com mulher mais jovem. Por que uma mais nova também não pode fazer isso? É uma questão de identificação. De se reconhecer no outro. É muito careta essa coisa de que o homem tem de ser mais velho. O que tem de existir é verdade na relação. Não acho errado e nem me furtaria de viver uma coisa assim caso acontecesse.
A Amélia é uma mulher elegante, assim como a maioria de suas personagens na tevê, mas vive em uma fazenda. Você precisou buscar um lado mais rústico nessa personagem?
Não. Sou muito à vontade com mato e essas coisas. E louca por cavalo. Tanto que a primeira profissão que quis seguir foi de veterinária. Queria morar no Rio Grande do Sul e criar cavalo. Fui para Pirenopólis com a equipe da novela e achei uma pena ter ficado tão pouco tempo. A Amélia sabe fazer as coisas, monta a cavalo, mas não é de chegar e colocar a mão na terra, por exemplo. Tem um certo refinamento que destoa dessa coisa de fazenda. Meus personagens às vezes pedem essa elegância, mas já fiz mulheres mais simples, de interior. Gosto de fazer coisas diferentes e a Amélia é infinitamente diferente de mim.
Você definiu Araguaia como um novelão. Depois de quase 30 anos de carreira, sente muita diferença no conteúdo das novelas de hoje?
Um pouco. O fato de ter muita novela durante o ano inteiro, uma engatilhada na outra, causa um desgaste natural. Também não há renovação de autores. A televisão mudou. Entrou internet, TV a cabo, DVD. Os tempos são outros e o público também. A juventude, antenada, não vê novela. Vê séries. Adoro séries e acho que elas vão ser o que foi a novela para os anos 60 e 70. São compactas e têm uma agilidade maior de gravação e produção. Eu iria amar viver de seriado, teatro e cinema. Seria um luxo. Mas também gosto de fazer novela. Quando falo novelão, é no bom sentido. O Negrão é um dos dinossauros da televisão. Junto com a Ivani Ribeiro, Janete Clair, Cassiano Gabus Mendes, Dias Gomes, essas pessoas que fizeram novelas maravilhosas.
Mas você estava sem fazer novela há quase três anos. Por que voltar agora
Já haviam me chamado para fazer Escrito nas Estrelas e não pude. Sabia que em algum momento teria de voltar porque não trabalhava na tevê há mais de um ano, quando fiz Tudo Novo de Novo. Quando o Marquinhos (Schechtman, diretor da novela) me chamou, foi um convite irrecusável. Ele é quase meu irmão. Sempre que pinta um trabalho, penso no personagem, obviamente, mas também penso muito no todo: na novela, quem são os outros personagens, atores, quem escreve e o que pode ser da trama. É um pouco como cinema, não adianta ter um papel maravilhoso em um filme ruim.
O teatro e o cinema ocupam parte considerável de seu tempo como atriz. São prioridades?
Não acho que o teatro está acima de tudo e a tevê vem depois. Acho que me completo fazendo as duas coisas. Sou uma atriz melhor de televisão quando estou fazendo teatro. Para mim, funciona assim. Quando faço teatro, sinto que venho gravar mais quente, aguçada. Procuro fazer sempre os dois, mas não estou mais tão atirada quanto antigamente. Sinto que dei uma cansada porque o trabalho duplo é muito desgastante. Às vezes, gravo no Projac quatro ou cinco dias por semana e faço uma peça de quinta a domingo. Quase não tenho tempo para mim.
Mas você diria que vive seus personagens mais interessantes nos palcos?
Acho que sim. No teatro, principalmente, você consegue ir mais fundo nas coisas. Não faço um personagem que remeta a outro. É tudo muito diferente. Por isso, não me importo de eventualmente viver um papel um pouco mais normal em novelas. Mas também fiz personagens na tevê que gostei muito, como a Dona Júlia de JK, a Clara de Tudo Novo de Novo e a Genésia de Porto dos Milagres. Talvez a minha dedicação à televisão não seja tão completa. Como gosto de fazer teatro e cinema, nem sempre dá para conciliar com uma novela e, às vezes, fico um tempo longe.
Você começou sua carreira na Band, passou pela Manchete e teve algumas idas e vindas na Globo. O que essa mobilidade trouxe para a sua carreira?
Sempre achei legal ter essa independência, a possibilidade de estar em um lugar agora e em outro depois. Em cada um fiz uma história, construí coisas com amigos e vivi personagens legais. Foi uma caminho bacana do qual me orgulho. Acho que, de alguma forma, a Globo também aprendeu a lidar com essa minha coisa saindo e voltando. Há um respeito entre nós e uma valorização por eu ser uma atriz que faz teatro, cinema... Eles sabem que têm uma profissional que pode fazer vários produtos. Já fiz comédia, drama e não sou só a mocinha ou a vilã. Tenho um leque de possibilidades grande.
Que lembranças carrega do tempo em que trabalhou em outras emissoras?
Presenciei a criação do núcleo de dramaturgia tanto da Bandeirantes quanto da Manchete. Fiz vários trabalhos legais, mas um dos mais marcantes nem foi ao ar, que foi a minissérie O Marajá, que contava a história do Collor e do impeachment (em 1993). Não foi exibida porque ele embargou na Justiça. Gravamos os 40 capítulos, que sumiram e ninguém sabe onde foram parar. Era uma sátira incrível. Depois fizemos Guerra Sem Fim, outra novela maravilhosa, para cobrir esse buraco.
Foi em Guerra Sem Fim que você conheceu o Alexandre Borges, seu marido há 20 anos. Que influências vocês têm na carreira um do outro?
Já trabalhamos bastante juntos. Estamos sempre de olho um no outro. Se precisar, passamos textos juntos, vemos cenas e trocamos ideia. Mas também respeitamos muito o que cada um pensa naquele momento. Eu digo que o Alê é meu primeiro público. Se ele gostou, fico tranquila. É uma pessoa bem exigente e cujo trabalho admiro muito. Se ele gostou, sei que já tenho meio caminho andado. O resto, se falarem mal, eu nem me importo.
Araguaia - Globo - Segunda a sábado, às 18h.
Herança de família
A atuação sempre foi algo familiar para Júlia Lemmertz. Mas, apesar do exemplo dos pais, os atores Lineu Dias e Lilian Lemmertz, Júlia garante que seguir a carreira artística nunca foi uma pretensão. Tanto que, até os 18 anos, seu sonho era cursar uma faculdade de Veterinária e se dedicar à criação de cavalos em Porto Alegre, onde nasceu. Os planos, no entanto, foram por água abaixo assim que ela foi aprovada nos testes para viver uma das protagonistas da novela Os Adolescentes, exibida em 1981 na Bandeirantes. "Talvez eu tenha querido fazer Veterinária para fugir um pouco desse universo da atuação que predominava na minha casa. Fiz os testes sem nenhuma pretensão e, quando vi, estava atuando e adorando aquilo tudo", lembrou.
Para Júlia, a maior desvantagem do interesse tardio pela atuação foi ter tido pouco tempo para conversar mais com a mãe, que morreu quando ela tinha 23 anos. "Não deu para trocar muita figurinha. Mas sei que ela torcia por mim, assim como torço ao ver minha filha, que está começando a fazer teatro", contou.
Nas telonas
Antes de começar a gravar Araguaia, Júlia Lemmertz se dedicou às gravações do filme Amor?, de João Henrique Jardim, que estreia nos cinemas ainda este ano. Estrelado por ela e atrizes como Lilia Cabral, Fabiúla Nascimento e Mariana Lima, o longa é baseado em depoimentos reais de mulheres que falam sobre o lado ruim e problemático do amor. "Foi um trabalho dificílimo porque nós lemos os depoimentos dessas mulheres e tínhamos que criar tudo a partir daí. Mas é um projeto muito interessante", avaliou.
Trajetória Televisiva
# Os Adolescentes (Band, 1981) - Bia.
# Ninho da Serpente (Band, 1982) - Mariana.
# Moinhos de Vento (Globo, 1983) - Milena.
# Sabor de Mel (Band, 1983) - Beatriz.
# Eu Prometo (Globo, 1983) - Adriana.
# Amor com Amor se Paga (Globo, 1984) - Ângela.
# Tenda dos Milagres (Globo, 1985) - Luísa.
# Mania de Querer (Manchete, 1986) - Carolina.
# Carmen (Manchete, 1987) - Micaela.
# Kananga do Japão (Manchete, 1989) - Silvia.
# Na Rede de Intrigas (Manchete, 1991) - Teresa.
# Amazônia (Manchete, 1991) - Maria Luísa.
# Guerra Sem Fim (Manchete, 1993) - Flávia.
# Quem é Você? (Globo, 1996) - Débora.
# Zazá (Globo, 1997) - Fabiana.
# Andando nas Nuvens (Globo, 1999) - Lúcia Helena.
# Porto dos Milagres (Globo, 2001) - Genésia.
# Esperança (Globo, 2002) - Geovanna.
# O Beijo do Vampiro (Globo, 2002) - Marta.
# Celebridade (Globo, 2003) - Noêmia.
# Alma Gêmea (Globo, 2005) - Cleide.
# JK (Globo, 2006) - Dona Júlia.
# Desejo Proibido (Globo, 2007) - Dona Belinda.
# Amazônia - De Galvez a Chico Mendes (Globo, 2007) - Risoleta.
# Tudo Novo de Novo (Globo, 2009) - Clara.
# Araguaia (Globo, 2010) - Amélia.
Terra

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