sábado, outubro 30, 2010

No segundo turno, embate e falta de propostas


 

Uma campanha vazia

Dilma Rousseff e José Serra (Nacho Doce/Reuters)
Às vésperas do segundo turno, o candidato José Serra (PSDB) foi agredido no bairro de Campo Grande, zona oeste do Rio de Janeiro, durante uma de suas carreatas. Militantes do PT, partido de sua concorrente, Dilma Rousseff, atiraram contra o tucano um rolo de fita adesiva. A agressão interrompeu a agenda do candidato e ganhou uma repercussão surpreendente nas redes sociais e nos veículos de comunicação.
A polêmica virou pauta de discursos inflamados e chegou a ser comentada de forma inapropriada pelo presidente Lula, que ironizou o fato. Coube ao Jornal Nacional, da Rede Globo, esclarecer o caso. Mas por que um assunto distante das discussões relativas ao futuro do país marcou o segundo turno de forma tão presente, enquanto programas de governo simplesmente desapareceram? Para cientistas políticos ouvidos pelo site de VEJA, o “fenômeno” retrata o vazio da campanha deste ano, especialmente no segundo turno.
Aborto, religião e casamento gay ocuparam as lacunas das propostas. O eleitor foi a principal vítima. O sociólogo e cientista político Antonio Lavareda explica: é comum, em embates acirrados, a promoção de críticas pessoais. Para o especialista, a internet “ateou mais lenha na fogueira” e ajudou na repercussão de assuntos que, à primeira vista, podem ser considerados “pequenos” pelos eleitores que buscam racionalidade.
Luiz Eduardo Soares, cientista político da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ), concorda. E destaca a dinâmica do segundo turno, geralmente baseado nos pontos de vulnerabilidade do adversário. “A feira livre da exploração de temas polêmicos vira uma arma entre os candidatos. É estratégico para eles exaltarem esses temas”, ressalta. Soares também explica a razão pela qual todos os candidatos preferem correr para o centro nesta reta final das eleições. “Os presidenciáveis da esquerda e da direita já garantiram os seu votos. Agora, eles buscam novos eleitores.”
Marqueteiros – O papel dos marqueteiros é muito importante em modelos eleitorais curtos como o brasileiro. “Nesse período a sorte fica depositada na mão desses membros de campanha”, lembra Lavareda. São eles os responsáveis pela promoção dos assuntos populares. Os marqueteiros incentivam os candidatos a apostarem suas fichas em temas genéricos, mas passíveis de um longo debate. O cardápio é baseado em pesquisas quantitativas e qualitativas realizadas ao longo de toda a campanha.
Carlos Manhanelli, presidente da Associação Brasileira dos Consultores Políticos, diz que há quatro imagens para os melhores candidatos adotarem, segundo o teórico Roger-Gérard Schwartzenberg, escritor da obra L’État Spectacle (O Estado do Espetáculo): o herói, que vai resolver todos os problemas; o pai (ou a mãe), que vai cuidar dos pobres, fracos e oprimidos; o líder charme, que conquista votos através da sua elegância; e o homem simples, que emerge das massas para comandá-las.
Embora os especialistas reconheçam que os debates sobre aborto, religião ou casamento gay são superficiais, eles declaram que é preciso abordar certos assuntos para ganhar uma eleição. “É uma conduta usual. Temas sem importância aparecem no varejo por que são mais convenientes para o oportunismo eleitoral”, ressalta Luiz Eduardo Soares.
Para o cientista político David Fleischer, da Universidade de Brasília (UnB), o ideal seria abordar os problemas do Brasil ao invés de ficar no âmbito dos ataques pessoais. Ele lembra que a desenvoltura dos candidatos foi melhor durante as entrevistas do que ao longo dos debates. “Quando eles tentavam fugir das perguntas, pelo menos os jornalistas os colocavam na parede.”
Renata Honorato e Paula Reverbel VEJA

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